terça-feira, 4 de junho de 2013

A Magia da Arte Infantil


«Antes eu desenhava como Rafael, mas precisei de toda uma existência para aprender a desenhar como as crianças.»


Picasso


"Fiquei em certa ocasião encantado com uma visão inesperada no meu atelier. Era àquela hora em que o crepúsculo avança. Regressava a casa com a minha caixa de tintas...e subitamente vi um quadro incrivelmente belo, banhado por cores interiores. Primeiro, fiquei parado, mas depois aproximei-me rapidamente deste quadro misterioso, no qual apenas discernia formas e cores e cujo conteúdo me era incompreensível. Logo encontrei a chave do enigma: era um quadro meu, encostado de lado contra a parede."


Kandinsky

«Ao final do seu primeiro ano de vida, a criança já é capaz de manter ritmos regulares e produzir seus primeiros traços gráficos, fase conhecida como dos rabiscos ou garatujas (termo utilizado por Viktor Lowenfeld para nomear os rabiscos produzidos pela criança).» (1) Os primeiros rabiscos da criança, estão aí: as varreduras rítmicas (fig.1). Durante muito tempo estes traços em vaivém, não figurativos ou pré-figurativos (quando se desdobram em algumas formas) encontravam-se desviados da produção plástica. Faltava o objecto, o tema concreto: as mãos, o pássaro, a árvore, a flor, a lua, o sol, o rio, a serra, a casa, a nuvem, o pai, a mãe. Mas a revolução na arte verificada no início do século XX veio pôr em cena a liberdade de composição. A criança através dos seus impulsos interiores produz arte, aventura-se num acto criador: a pressão da mão sobre o suporte (dura ou macia), a expressão do rosto (alegre ou triste) e a escolha das cores deixam transparecer emoções e representam cenas vividas e fechadas numa linguagem mágica e primitiva. Mais tarde, aos sete anos, a ”Catarina” não hesitou em dar o título a um desses quadros de garatujas: raios solares. Seria o deslumbramento pela luz, a sua grande motivação? O brilho dos olhos e a leveza do traço só nos podem revelar um instante de harmonia. O mistério só permanece porque não é possível sondar e estabelecer a relação íntima do objecto com o sujeito.


Fig.1. Abstracto

«Na evolução da garatuja para o desenho de formas mais estruturadas (fig.2 e 3) a criança desenvolve a intenção de elaborar imagens no fazer artístico. Começando com símbolos muito simples, ela passa a articulá-los no espaço bidimensional do papel, na areia, na parede ou em qualquer outra superfície. Passa também a constatar a regularidade nos desenhos presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos quais ela tem acesso, incorporando esse conhecimento em suas próprias produções. No início, a criança trabalha sobre a hipótese de que o desenho serve para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da simbolização, a criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos de representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese de que o desenho serve para imprimir o que se vê. É assim que, por meio do desenho, a criança cria e recria individualmente formas expressivas, integrando percepção, imaginação, reflexão e sensibilidade, que podem então ser apropriadas pelas leituras simbólicas de outras crianças e adultos.» (2)
Luís Dantas

Fig.2. Primavera


Fig.3. Festa.1999

(1) Thereza Bordoni.
(2) Thereza Bordoni.

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